Eu ainda não fui à praia este ano. Mas apetece-me tanto. Não porque me queira encontrar. Isso acho que não me faz falta. Tenho essa ideia, que eventualmente pode estar errada, de que sempre, ou pelo menos de há uns anos para cá, que sempre fui muito "encontrada" comigo própria. Mas apetece-me deitar-me na areia e ver as minhas mãos contra o céu. É uma coisa que faço desde pequena e que, não sei porquê, me dá a sensação de que posso fazer tudo, mesmo aquilo que nunca hei-de fazer. E daí não sei. A minha vida tem mudado tanto. Tantas vezes. Mesmo sem eu querer e sem mudar de cidade. Já estou um bocado farta disso. Das surpresas. Ando a tentar fazer que as coisas mudem, mas mudem como eu quero.
Também eu fui à praia sem levar fato de banho.
Depois de uns dias em Amsterdão, fui a Haia, à entrevista de emprego e depois ver a cidade.
Foi uma viagem esquisita porque havia a possibilidade de ir pra lá viver.
Então eu olhava para as coisas perguntando-me se gostaria de passar lá o meu dia a dia.
Quando cheguei a Haia, estava frio, a cidade é fria, muito diferente de Amsterdão. Antes da entrevista já eu estava a achar que era uma cidade onde eu não seria feliz.
A entrevista correu bem, a senhora inglesa muito simpática, o rapaz holandês tinha uns pés muito grandes com uns sapatos muito feios mas era também muito simpático. Não me lembro bem se se chamava Olsson ou Olaf. É Olaf.
Depois da entrevista fui conhecer a cidade.
E fui à praia no mar do Norte.
Sentei-me a apanhar conchas.
Pensei em muita coisa sem importância, nem por isso me encontrei ali.
Isso aconteceu mais tarde.
Depois da viagem, depois de me ligarem a dizerem que tinham escolhido uma senhora holandesa mais velha, com mais experiência, mas que gostaram muito de mim, bla, bla, bla, a conversa do costume.
Depois disso confesso: senti-me perdida.
Porque o que me levou a ir à entrevista foi ir embora.
Foi a possibilidade de me ir embora.
Foi a hipótese de mudança.
Não fiquei muito triste por não me terem escolhido, não tive que tomar nenhuma decisão.
Ia ser tão difícil, ir trabalhar pra um país estrangeiro, longe dos que amo.
Mas eu ia embora.
E não vos sei bem explicar porque é que isso me dava alegria, mas dava.
Na praia em Haia, pensei que era bom ter trazido fato de banho. O mar estava mais quentinho do que alguns dias na Ericeira.
A hipótese real de mudar de vida acho que mexeu um bocadinho comigo.
Sentada no sofá na casa do Gonçalo, enquanto ele me contava acerca das pessoas que iam morar lá na casa dele nos próximos meses, eu olhei em frente, pra janela da cozinha e acho que me encontrei assim um bocadinho.
Não tinha a ver com o sítio nem com a conversa, tinha a ver com coisas que temos que fazer sozinhos. Acho que me vi mas assim só um bocadinho, não me encontrei toda claro.
Tenho que ser uma mulherzinha, não é?
Nem sempre decidem por nós…
Apetece-me escrever aqui no blog um post à antiga. Daqueles que não seja só uma letra de uma canção mesmo que, parecendo que não, digam muito, muito sobre mim. Apetece-me escrever um post daqueles que me comprometam. Que me façam ter medo de que os meus amigos decubram o blog (como se houvesse algum que ainda se interessasse). Que me faça arrepender e ter vergonha daqui a outros 6 anos.
6 anos...
Vou fazer isso.
Vou escrever.
Hoje li o meu signo, numa revista emprestada. Foi chato. Não sei porque é que caí nessa asneira. Não gosto dos signos porque nunca acertam. Ou pior ainda, quando me parecem que acertam e eu não gosto do que têm para me dizer. Há um post da Madalena, aqui no criado, sobre as coisas que escondemos no fundo de nós, as nossas intuições, as coisas que recalcamos porque não queremos lidar com elas, mas que no fundo sabemos, sabemos sempre o desfecho .
Ora o meu signo dizia que eu vou ter uma vida afectuosa confusa e que tenho de escolher entre viver apaixonadamente ou feliz. Dizia ainda que caso já estivesse consciente dessa escolha, já teria tomado uma decisão e estava bem melhor do que pensava. E eu vou logo ver à capa da revista: mas isto é semanal ou mensal? Isto é mesmo deste mês? É que, quero dizer, há coisas que eu sei e com as quais consigo viver, mas esfregarem-me assim com elas na cara, não me parece bem, não há direito... Os astrólogos da Máxima armados em sensatos, a querer dizer-me como é que hei-de resolver as minhas merdas e a dizer-me que estou melhor do que penso, logo a mim que sou tão sensata. Pareceu-me um bocado abusivo.
E eu hoje andei por aí e fui a uma festa de aniversário e estive com pessoas bonitas que arranjaram empregos novos e que vão casar e que vão ter filhos e que vão comprar casas e eu dou-me conta de que é mesmo assim, que devagar a vida muda.
E depois fomos todos à praia.
Quando penso em praia, lembro-me sempre do poema do cummings
maggie and milly and molly and may
went down to the beach to play one day
Eu não vou copiar o poema todo, vão procurá-lo que vale a pena. É curto, curto e é lindíssimo, uma das coisas mais bonitas que já li, sobre quatro amigas que vão à praia e encontram e se encontram com coisas muito diferentes: monstros e pedras e búzios e mundos.
Redescobri o prazer de ir à praia desde há alguns (poucos) anos.
E há dias em que sou a Maggie. E dias em que sou a Milly. E dias em que sou a Molly. E dias em que sou a May.
Hoje, por azar, não levei fato de banho e fui passear para a beira mar e apanhei conchas e molhei a saia e olhei para as pessoas e andei de um lado para o outro no areal, a pensar na vida e no que dizia o meu signo para o mês de Agosto.
É que ainda não vos disse mas sinto que acabo de passar por uma encruzilhada e que tive que ir por algum lado e fui por um que ainda não sei bem qual é e olhem fui fingir que isso não era nada importante debaixo do sol à beira mar.
E o poema do cummings acaba assim:
For whatever we lose (like a you or a me)
it's always ourselves we find in the sea.
E olhem, eu fiquei uma hora ou isso, para ali a apanhar conchas e a tentar encontrar-me a mim mesma, mesmo que fosse só por um bocadinho, a pensar que ele (o cummings e o signo) tem mesmo razão: que não consigo fugir de mim, que é só uma questão de tempo até ter de me confrontar com as coisas dentro de mim que não quero saber, mas que vou sabendo...
E olhem, ali à beira mar na praia, comigo, cheguei à conclusão de que não estava mal, que estava ali bem comigo e fui uma boa companhia em todo o meu caminho de volta para casa.
Ou como Deus escreve direito por linhas tortas
Nem de propósito, ontem à noite fui a um concerto muito fraquinho de uma banda portuguesa muito bem intencionada. Estava frio e tudo (o concerto era ao ar livre) mas valeu a pena ficar para ouvir uma cover decente disto:
I'm the guy who didn't marry pretty Pamela Brown
Educated, well-intentioned, good girl in our town
I wonder where I'd be today if she had loved me too
Probably be driving kids to school
I guess I owe it all to Pamela Brown
All of my good times and all my roamin' around
One of these days I might come ramblin' through your town
And I guess I owe it all to Pamela Brown
I've seen the lights of cites and I've been inside their doors
I've sailed to foreign countries and I've walked upon their shores
I guess the guy she married was the best part of my luck
She dug him 'cause he drove a pick-up truck
I guess I owe it all to Pamela Brown
All of my good times and all my roamin' around
One of these days I might come ramblin' through your town
And I guess I owe it all to Pamela Brown
I don't have to tell you just how beautiful she was
Everything it takes to get a country boy in love
Lord, I hope she's happy 'cause she sure deserves to be
Especially for what she did for me
I guess I owe it all to Pamela Brown
All of my good times and all my roamin' around
One of these days I might come ramblin' through your town
And I guess I owe it all to Pamela Brown
